23.9.13

247

A vida prática sempre me pareceu o menos cómodo dos suicídios. Agir foi sempre para mim a condenação violenta do sonho injustamente condenado. Ter influência no mundo exterior, alterar coisas, transpor entes, influir em gente — tudo isto pareceu-me sempre de uma substância mais nebulosa que a dos meus devaneios. A futilidade imanente de todas as formas de acção foi, desde a minha infância, uma das medidas mais queridas do meu desapego até mim.
Agir é reagir contra si próprio. Influenciar é sair de casa.
Sempre meditei como era absurdo que, onde a realidade substancial é uma série de sensações, houvesse coisas tão complicadamente simples como comércios, indústrias, relações sociais e familiares, tão desoladoramente incompreensíveis perante a atitude interior da alma para com a minha ideia de verdade.

Pessoa, Fernando — Livro do Desassossego

27.8.13

71.

Aquilo que, creio, produz em mim o sentimento profundo, em que vivo, de incongruência com os outros, é que a maioria pensa com a sensibilidade, e eu sinto com o pensamento.
Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar.
É curioso que, sendo escassa a minha capacidade de entusiasmo, ela é naturalmente mais solicitada pelos que se me opõem em temperamento do que pelos os que são da minha espécie espiritual. A ninguém admiro, na literatura. mais que os clássicos, que são a quem menos me assemelho. A ter de escolher, para leitura única, entre Chanteaubriand e Vieira, escolheria Vieira sem necessidade de meditar.
Quanto mais diferente de mim alguém é, mais real parece, porque menos depende da minha subjectividade. E é por isso que o meus estudo atento e constante é essa mesma humanidade vulgar que repugno e de que disto. Amo-a porque a odeio. Gosto de vê-la porque detesto senti-la. A paisagem, tão admirável como o quadro, é em geral incómoda como leito.

Pessoa, Fernando in O Livro do Desassossego

15.7.13

Sometimes

"The more you look the less you know"

29.6.13

Jane Fulton Suri, 2005

It is essencial to the success of interaction design that designers find a way to understand the perceptions, circumstances, habits, needs, and desires of the ultimate users

22.6.13

Summer

This will be the worst of them all

8.6.13

283


“A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas de espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do Destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti, se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa, sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.
A morte é a libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos seus triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou.
Por isso a morte enobrece, veste de galas desconhecidas o pobre corpo absurdo. É que ali está liberto, embora o que não quisesse ser. É que ali não está um escravo, embora ele chorando perdesse a servidão. Como o rei cuja maior pompa é o seu nome de rei, e que pode ser risível como homem, mas como rei é superior, assim morto pode ser disforme, mas é superior, porque a morte o libertou.
Fecho, cansado, as portas das minhas janelas, excluo o mundo e um momento tenho liberdade. Amanhã voltarei a ser escravo; porém agora, só, sem necessidade de ninguém, receoso apenas que alguma voz ou presença venha interromper-me, tenho a minha pequena liberdade, os meus momento excelsis.
Na cadeira, aonde me recosto, esqueço a a vida que me oprime. Não me doí senão ter-me doído.”

—Fernando Pessoa, Livro do Desassossego

Edição de Richard Zenit, cedida por Assírio&Alvim e Herdeiros de Fernando Pessoa, 1998 Publicada em 2000 como suplemento da revista Visão

25.3.13

First Z